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Esse é um texto autobiográfico! Quero dividir com vocês além das minhas impressões de Psicóloga, minhas impressões maternas, sobre ter tido um filho que chupou chupeta e uma filha que chupou dedo.

Então vamos começar falando sobre o quanto eu ficava incomodada com o reforço social do comportamento de chupar o dedo. Em praticamente todos os lugares que eu ia com minha filha e ela levava o dedo na boca, existia um frenesi sobre ser bonitinho, pessoas que queriam me contar que também chupavam dedo, ou que algum filho chupava, ou um julgamento do tipo: “ela chupa dedo? Tira logo porque depois é mais difícil”. As reações das pessoas eram constantes—desde comentários descritivos como “ela chupa dedo” até observações carregadas de julgamento.

Em relação ao meu filho que chupava chupeta, não enfrentei nada disso. Na minha casa, o uso da chupeta sempre esteve associado ao momento de dormir. Por isso, no dia a dia, praticamente não enfrentei julgamentos sobre o hábito. Além disso, logo após meu filho completar um ano, tiramos a chupeta, e tudo seguiu seu curso naturalmente, então não enfrentamos aqueles julgamentos sobre a criança ser mais velha e ainda chupar chupeta.

A maternidade nos ensina, desde o início, que nem tudo ou quase nada está sob nosso controle—e a sucção do dedo é um desses exemplos. Podemos até decidir não oferecer a chupeta, e está tudo certo com essa escolha. Mas e o dedo? Ele já está ali, acessível à criança. Se ela tem uma necessidade maior de sucção ou descobre conforto nesse hábito, é natural que passe a chupá-lo. E como os bebês realmente possuem essa necessidade fisiológica, não faria sentido brigar com a própria biologia, não é?

Os artigos em odontologia evidenciam (Almeida, 2023; Silva & Fernandes, 2022):


Os hábitos de sucção não nutritiva, como chupar o dedo ou usar chupeta, são comuns na infância e podem ter implicações no desenvolvimento oral e dentário das crianças. A literatura odontológica destaca que a persistência desses hábitos está associada a alterações na oclusão dentária, como mordida aberta anterior e mordida cruzada posterior. Essas alterações estão relacionadas à frequência, duração e intensidade do hábito.

Estudos indicam que a sucção do dedo, embora menos frequente, pode acarretar problemas dentários mais significativos do que o uso da chupeta, especialmente porque tende a persistir por mais tempo, podendo afetar a dentição permanente.

É importante que pais estejam atentos a esses hábitos e busquem orientação profissional para prevenir ou minimizar possíveis consequências negativas no desenvolvimento oral das crianças.

Do ponto de vista da Psicologia, tanto a sucção do dedo quanto o uso da chupeta são comportamentos parecidos, mas diferentes. A chupeta é um estímulo introduzido, que gera uma consequência reforçadora. Já o dedo também proporciona um reforço, mas a partir de um estímulo autoestimulatório. E é justamente esse tipo de estímulo que está por trás dos comportamentos mais desafiadores de manejar.

Como manejar esses comportamentos?

Com o tempo, o hábito da sucção passa a estar mais relacionado ao conforto emocional do que a uma necessidade real. Isso significa que ele pode ser substituído por outras estratégias, como carinho, colo, atenção, uma soneca aconchegante—formas de acolhimento que envolvem contato físico e fortalecimento do vínculo afetivo.

Então, não precisamos sentir pena ao ajudar a criança a mudar esse hábito. À medida que ela cresce, seu mundo se expande, suas habilidades aumentam, e ela precisa desenvolver outras formas de lidar com o ambiente ao redor.

Se a retirada da chupeta ou do dedo acontece antes da criança entrar plenamente no mundo verbal, o manejo tende a ser mais simples e menos prolongado. Mas, quando a linguagem já está bem desenvolvida, o processo se torna mais verbal, mais lúdico, exigindo estratégias de negociação e comunicação. Isso pode torná-lo um pouco mais desafiador, mas ainda assim possível—e as pesquisas mostram que essas estratégias funcionam mesmo com crianças maiores (Muzulan & Gonçalves, 2011). Independente da idade, o importante é conversar com a criança, explicando e sinalizando cada etapa da mudança.

Existe um jeito certo de retirar a chupeta ou o dedo?

Não há um único caminho. O que existe é uma retirada respeitosa, adaptada a cada criança e família. Algumas famílias preferem tirar a chupeta aos poucos—seja reduzindo o tempo de uso, seja esperando que as chupetas estraguem sem reposição. Esse método pode funcionar, mas não evita o choro quando chega o momento final da retirada ou nos momentos críticos do hábito.

Aqui em casa, funcionou melhor fazer de uma vez. Criamos um marco simbólico para sinalizar o fim do hábito (algumas famílias optam por “dar a chupeta ao Papai Noel” ou outro ritual que faça sentido para a criança). No nosso caso, reunimos todas as chupetas, meu filho beijou uma por uma, jogou no lixo e se despediu. As primeiras noites foram acompanhadas de choro, mas com nosso suporte emocional ele foi aprendendo novas formas de adormecer.

Já o dedo é mais complexo, até para nós, adultos. Quem nunca pensou em substituir o dedo pela chupeta para depois retirar a chupeta? Algumas famílias fazem isso, e tudo bem, mas no fim, o processo será o mesmo—com choro e desconforto na transição. Não adianta a gente evitar o inevitável.

Diferente da chupeta, a sucção do dedo não pode ser retirada gradualmente, pois ele está sempre ali. Toda vez que a criança lembra que o dedo está disponível, o comportamento se mantém. Para lidar com hábitos autoestimulatórios como esse, é necessário impedir que aconteçam, pois outros estímulos concorrentes (como brinquedos ou atividades) não estarão sempre disponíveis para distraí-la.

Aqui em casa, minha filha machucou o dedinho de tanto chupar—o que acontece com algumas crianças e pode, por si só, ser um impedimento para o hábito. Mas, no caso dela, não foi suficiente. Então, precisei colocar um curativo no dedo para interromper o comportamento. Renovava o curativo após os banhos e, com o tempo, comecei a deixá-lo sem, sob supervisão, até que o hábito desaparecesse, inclusive à noite. Como todo comportamento autoestimulatório, foi um processo mais resistente, mas, com paciência, afeto, conversa e incentivo, conseguimos superar juntos.

A retirada da chupeta ou manejo do hábito do dedo pode ser um desafio, mas, com empatia e estratégias adequadas, é um processo possível. O mais importante é entender que, assim como o hábito foi aprendido, ele também pode ser substituído por outras formas de conforto e regulação emocional.

Saiba mais em nosso canal do YouTube: @mood.psi.comportamento

Referências

Almeida, G. R. de. (2023). “Hábitos de sucção não nutritiva: chupeta, mamadeira e dedo.” Revista de Odontologia Pediátrica, 15(2), 123-130.

Silva, M. A., & Fernandes, A. P. (2022). “Persistência de hábitos de sucção não nutritiva: prevalência e fatores associados.” Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, 22(3), 467-475.

Muzulan, C. F., & Gonçalves, M. I. R. (2011). O lúdico na remoção de hábitos de sucção de dedo e chupeta. Journal of the Brazilian Society of Speech-Language Pathology, 23(1), 66–70.

Escrito por:
Anna Beatriz Carnielli Howat Rodrigues 
CRP 16/2307 
Título de pós-doutorado em Saúde Mental pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Doutora em Psicologia Experimental e Especialista em Psicologia Comportamental Cognitiva pela Universidade de São Paulo, Mestre em Psicologia e Graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo. Idealizadora e apresentadora do VídeoCast Invisible.

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