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Inclusive, psicólogo adora ouvir sobre furacões que sopram leve. O processo de terapia é complexo e variado, apesar de muita gente achar que ele é um caminho de alivio de desconforto e só. É bem verdade que a maioria de nós vai buscar terapia na hora da crise e precisando de alivio. A crise é um momento de intenso sofrimento na vida de uma pessoa e ela tem como característica a desestruturação da relação da pessoa com ela mesma e com o mundo ao redor.

Nesses momentos, a pessoa costuma ter muita dificuldade de olhar para fora do furacão que está assolando ela e a terapia vai produzir direção para que ela consiga colocar o pé pra fora da bagunça e olhar por outros pontos de vista. Mas acredite, não é porque esse alivio foi produzido, que vc necessariamente estaria de alta da terapia. não é por que você nao tem aversivos e confusões para contar pro seu terapeuta, que você nao precisa de terapia.

Momentos de crise vão exigir que nós terapeutas tomemos posturas terapêuticas condizentes com crise. As pesquisas na área de manejo de crise mostram o quanto nesses momentos o paciente se beneficia de posturas mais diretivas e resolutivas. No entanto, quando a intensidade passa, é interessante se permitir desenvolver habilidades… mas pra quê? Para que no próximo momento que o furacão começar a soprar, vc o maneje pra vento forte.

Noel Burch, no anos 70, propôs uma linha estrutural geral baseada nos Quatro Estágios da Competência que descrevem o processo pelo qual uma pessoa passa ao adquirir uma nova habilidade ou conhecimento e serve para suas habilidades na sua profissão, no novo esporte que vc começou e também, para o desenvolvimento de habilidiades na terapia.

Particularmente, eu acho muito legal trabalhar essa ideia didaticamente estruturada com o paciente, pois assim podemos dar a ele informações mais assertivas do processo pelo qual está passando. Neste sentido, os estágios propostos seriam:

  1. Incompetência Inconsciente: Neste estágio, o indivíduo não tem conhecimento sobre sua falta de habilidade ou sobre a existência da habilidade em si. Ou seja, ele “não sabe que não sabe”. Por exemplo, uma criança que ainda não foi exposta à matemática não está ciente de sua incapacidade de resolver equações, um paciente que chega em franco sofrimento, não é consciente da incapacidade dele de manejar aquilo tudo.Daí na terapia ele vai percebendo e reconhecendo a importância de adquirir determinada habilidade para lidar com seus problemas e rapidamente entra na fase da:
  2. Incompetência Consciente: Ela “sabe que não sabe” e entende a necessidade de aprender, mas ainda não sabe como fazer. Esse é aquele momento que as pessoas acham que já entenderam e agora é colocar a mão na massa. Mas é exatamente isso que os Psicólogos vão te ajudar a fazer, pois neste caso, colocar a mão na massa não é só seguir receita de bolo. Daqui pra terceira fase é trabalho árduo até a conquista da:
  3. Competência Consciente: Neste estágio, o indivíduo já adquiriu a habilidade, mas precisa de atenção e esforço para aplicá-la corretamente. Ele já consegue ser mais assertivo com a esposa, por ex. Mas quando ele chega no final daquela conversa, ele está cansado, ou quando precisa enfrentar uma reunião no trabalho, enfim… Ele “sabe que sabe”, mas a execução ainda não é automática. Sabe um exemplo bom? Alguém que aprendeu a dirigir, alguém que acabou de tirar carteira. Ele sabe dirigir, sabe que não é tão habilidoso ainda, e que precisa se concentrar em cada ação ao volante.
  4. E por fim, ele vai conquistar a alta, a tão almejada alta, quando atinge a Competência Inconsciente. Aqui, a habilidade foi tão praticada que sua execução se torna natural e automática. A pessoa realiza a tarefa sem precisar pensar conscientemente sobre ela. já faz parte do repertório dela. Aquela pessoa que chega na terapia e me conta que eu não imagino o que ela conseguiu fazer, como ela foi habilidosa em uma conversa difícil que precisou ter, enfim… alguém que já dirige habilidosamente sem tanta atenção a todos os movimentos.

Por isso, continuar na terapia mesmo quando os ventos estão mais calmos ajuda a desenvolver habilidades necessárias pro autoconhecimento e independência emocional. É nesse terreno mais estável que conseguimos construir repertórios sólidos, desenvolver habilidades e fortalecer aquilo que chamamos de autonomia do nosso paciente.

A alta terapêutica, então, não acontece quando a tempestade passa — mas quando você aprende a navegar, ainda que o mar volte a agitar.
A psicoterapia não é só para apagar incêndios, mas para aprender a prevenir, a cuidar do terreno e até a construir abrigo.
Porque, no fim das contas, a maior conquista da terapia não é a ausência de crise — é como usar as suas ferramentas para deixá-las amenas.

E talvez o mais bonito seja perceber que aquilo que um dia te arrastou, com aprendizagem e desenvolvimento, você consegue atravessar.

Escrito por:
Anna Beatriz Carnielli Howat Rodrigues 
CRP 16/2307 
Título de pós-doutorado em Saúde Mental pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Doutora em Psicologia Experimental e Especialista em Psicologia Comportamental Cognitiva pela Universidade de São Paulo, Mestre em Psicologia e Graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo.

Dra Bia Howat é idealizadora e apresentadora de um videocast junto com Fernanda Mappa (@fernandamappa.pi) e Pollyana Paraguassu (@pollyanaparaguassu) chamado Invisible (@social.invisible) que vai ao ar no Youtube do Folha Vitória (@folhavitoria).

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